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19 de Abril de 2024
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    TUTELA JURISDICIONAL DO MEIO AMBIENTE

    há 21 anos

    André L. Borges Netto Advogado. Mestre e Doutorando em Direito do Estado pela PUC/SP. Professor Universitário (UCDB - Campo Grande/MS). SUMÁRIO: Capítulo I: INTRODUÇÃO. Capítulo II: MEIO AMBIENTE. 1. Conceito de Meio Ambiente. 2. Surgimento da Questão Ambiental. 3. Direito Constitucional ao Meio Ambiente. 4. Degradação do Meio Ambiente. 5. A Prevenção de Danos Ambientais. Capítulo III: INSTRUMENTOS PROCESSUAIS DE PROTEÇÃO AMBIENTAL. 1. Tutela dos Direitos Individuais, Coletivos e Difusos. 2. Ação Civil Pública. 3. Ação Popular. 4. Mandado de Segurança Coletivo. 5. Ação Direta de Inconstitucionalidade. 6. Ação Declaratória de Constitucionalidade. 7. Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão. 8. Mandado de Injunção. Capítulo IV: PROTEÇÃO PENAL DO MEIO AMBIENTE. Capítulo V: CONCLUSÕES GERAIS. Bibliografia. CAPÍTULO I: INTRODUÇÃO Após um semestre inteiro de estudos realizados sobre o direito urbanístico e ambiental, pensamos ser possível a elaboração de um estudo em que se verse, modestamente, a respeito da tutela constitucional do meio ambiente. Escolhemos o tema em razão da motivação surgida no decorrer do semestre letivo em analisar as principais questões relativas à proteção que o ordenamento jurídico pátrio dispensa ao meio ambiente. A partir dessa escolha, passamos a estudar e a redigir sobre tudo aquilo que estivesse ao alcance de nossa capacidade intelectual, perquirindo criticamente a respeito dos instrumentos processuais de proteção ambiental, sem deixar de lado temas como a proteção penal do meio ambiente, o surgimento da questão ambiental, a degradação do meio ambiente, a prevenção ambiental de danos por intermédio do estudo prévio de impacto ambiental e o tratamento constitucional dado ao meio ambiente. Esperamos ter dado nossa contribuição ao estudo do tema. CAPÍTULO II: MEIO AMBIENTE 1. Conceito de Meio Ambiente Deve ser entendido por meio ambiente, em sua significação comum, "o complexo de relações entre o mundo natural e o ser vivo, as quais influem na vida e no comportamento do mesmo ser" (René Ariel Dotti, verbete "Ecologia", "in" Enciclopédia Saraiva do Direito, Ed. Saraiva, 1977, p. 501). Autores há, no entanto, que preferem trabalhar com um conceito de meio ambiente que seja mais globalizante, no sentido de abranger toda a natureza original e artificial, bem como os bens culturais correlatos. É o caso do insigne José Afonso da Silva, que optou por definir o meio ambiente como "a interação do conjunto de elementos naturais, artificiais e culturais que propiciem o desenvolvimento equilibrado da vida em todas as suas formas" ("Direito Ambiental Constitucional", Malheiros Editores, 1994, p.2). O mesmo autor também deixa averbado que o conceito adotado compreende três classes de meio ambiente, a saber: "I - meio ambiente artificial, constituído pelo espaço urbano construído, consubstanciado no conjunto de edificações (espaço urbano fechado) e dos equipamentos públicos (ruas, praças, áreas verdes, espaços livres em geral: espaço urbano aberto); II - meio ambiente cultural, integrado pelo patrimônio histórico, artístico, arqueológico, paisagístico, turístico, que, embora artificial, em regra, como obra do homem, defere do anterior (que também é cultural) pelo sentido de valor especial que adquiriu ou de que se impregnou; III - meio ambiente natural, ou físico, constituído pelo solo, a água, o ar atmosférico, a flora, enfim, pela interação dos seres vivos e seu meio, onde se dá a correlação recíproca entre as espécies e as relações destas com o ambiente físico que ocupam" (ob. cit., p. 3). É grande a quantidade de definições legais de meio ambiente. Isto se dá porque o legislador federal e os estaduais, trilhando caminho que não lhes é próprio, optaram por estabelecer a noção do que se deve entender por "meio ambiente". Veja-se, de início, que a Lei Federal n.º 6.938, de 31.08.81, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, tratou do tema, definindo o meio ambiente como "o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas" (art. 3º, inc. I). Por sua vez, conforme nos dá conta o ambientalista Paulo Affonso Leme Machado ("Direito Ambiental Brasileiro", Ed. RT, 2ª ed., 1989, p. 56), os legisladores de diversos Estados Federados assim conceituaram o meio ambiente: - Rio de Janeiro: o Decreto-Lei 134/75 (art. 1º, § único) considerou como meio ambiente "todas as águas interiores ou costeiras, superficiais ou subterrâneas, o ar e o solo". - Alagoas: a Lei 4.090/79 (art. 3º) dispôs que "compõe o meio ambiente, os recursos hídricos, a atmosfera, o solo, o subsolo, a flora e a fauna, sem exclusão do ser humano". - Santa Catarina: a Lei 5.793/80 (art. 2º, inc. I) dispôs que meio ambiente é "a interação de fatores físicos, químicos e biológicos que condicionam a existência de seres vivos e de recursos naturais e culturais". - Minas Gerais: para a Lei 7.772/80 (art. 1º, § único) "meio ambiente é o espaço onde se desenvolvem as atividades humanas e a vida dos animais e vegetais". - Bahia: a Lei 3.858/80 (art. 2º) prescreveu que "ambiente é tudo o que envolve e condiciona o homem, constituindo o seu mundo e dá suporte material para a sua vida biopsicossocial". - Maranhão: a Lei 4.154/80 (art. 2º, § único, a) prescreveu que "meio ambiente é o espaço físico composto dos elementos naturais (solo, água e ar), obedecidos os limites deste Estado". - Rio Grande do Sul: a Lei 7.488/81 (art. 3º, inc. III) estabeleceu que meio ambiente é o "conjunto de elementos - águas interiores ou costeiras, superficiais ou subterrâneas, ar, solo, subsolo, flora e fauna - , as comunidades humanas, o resultado do relacionamento dos seres vivos entre si e com os elementos nos quais se desenvolvem e desempenham as suas atividades". Com essas noções de meio ambiente, é possível desvendar outras questões concernentes a ele, não sem antes observar que o princípio do desenvolvimento sustentado, segundo o qual "o direito ao desenvolvimento deve ser exercido de forma tal que responda eqüitativamente às necessidades ambientais e de desenvolvimento das gerações presentes e futuras" (Princípio n.º 3 da "Declaração do Rio de Janeiro/92"), é hoje objetivo a ser atingido pelas sociedades contemporâneas, haja vista sua íntima e indissociável relação com a proteção a ser dada ao meio ambiente. 2. Surgimento da Questão Ambiental Em termos mundiais, a preocupação em se editar leis protetoras do meio ambiente surgiu nos países do chamado "primeiro mundo". E isto se deu por uma razão muito simples: é que os países em desenvolvimento acumulam um número muito grande de indústrias, que com seus produtos e suas Tecnologias crescentemente mais sofisticadas, provocam graves problemas ambientais (tais como a destruição da camada de ozônio, a chuva ácida e o "efeito estufa"), que acabam por afetar toda a comunidade internacional. Tem-se, portanto, que a fonte de onde emanaram os primeiros textos normativos sobre o meio ambiente está localizada exatamente naqueles países que são os maiores responsáveis pelos problemas ambientais de caráter global. Assim é que se editou, no início de 1970 e nos Estados Unidos da América, o National Environmental Policy Act (NEPA), que teve como objetivo básico "enunciar uma política nacional que incentive uma produtiva e agradável harmonia entre o homem e o meio ambiente; promova esforços que evitem ou eliminem danos ao meio e à biosfera, bem como estimule a saúde e o bem-estar do homem; ampliar a compreensão dos sistemas ecológicos e das riquezas naturais importantes para a Nação"(art. 2º). Segundo noticia o professor carioca Luís Roberto Barroso ("Proteção do Meio Ambiente na Constituição Brasileira","in"RTDP 2/59), não parou aí a legislação norte-americana sobre o tema ambiental, eis que, posteriormente, inúmeras outras leis foram editadas, tais como: emendas ao Clear Air Act (1970), o Clean Water Act (1972), o Resource Conservation and Revovery Act (RCRA) e o Comprehensive Environmental Response, Compensation and Liability Act (CERCLA) de 1980, modificado em 1986, que trata basicamente da responsabilização pelo dano ambiental. Também nos países europeus a questão ambiental passou a ser objeto de consideração a partir da década de 70. Com o advento da "Declaração de Estocolmo sobre o Meio Ambiente", considerado o primeiro grande documento internacional na matéria (redigido e aprovado durante a Conferência da Nações Unidas sobre o Meio Ambiente, realizada em Estocolmo, em 1972), a Comunidade Econômica Européia estabeleceu o Primeiro Plano de Ação Ambiental, que prescreveu objetivos e princípios a serem implementados pelos países que a integram. Atualmente, encontra-se em vigor o Quarto Plano, com vigência até 1992 (cf. Luís Roberto Barroso, ob. cit., p.59). Já no Brasil, somente a partir da década de 1980 é que se passou a editar com maior celeridade textos normativos voltados à tutela do meio ambiente. Predominou entre nós, por muito tempo, "a desproteção total, em parte devido à concepção individualista do direito de propriedade, que sempre constituiu forte barreira à atuação do poder público na proteção ambiental. O conjunto dos diplomas legais até então não se preocupava em proteger o ambiente de forma específica e global, dele cuidando de maneira diluída e mesmo casual e na exata medida de atender sua exploração pelo homem" (Édis Milaré, "Tutela Jurisdicional do Ambiente" , "in" Revista do Advogado, AASP, n.º 37, p. 9). Pode-se dizer que o março mais importante da resposta que o ordenamento jurídico pátrio tem dado ao verdadeiro clamor mundial pela proteção do meio ambiente é o da edição da Lei n.º 6.938, de 31 de agosto de 1981, que traçou a política nacional do meio ambiente e concedeu, como um dos mecanismos de sua formulação e aplicação, legitimação ao Ministério Público, da União e dos Estados, para propor ação de responsabilização civil por danos causados ao meio ambiente (art. 14, § 1º). Posteriormente, foi promulgada a Lei n.º 7.347, de 24 de julho de 1985, que disciplinou a ação civil pública como instrumento processual específico para a defesa do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos. Mas foi com o surgimento da Constituição Federal de 1988 que passou a proliferar um grande número de diplomas legais relativos à proteção ambiental. A par da rica disciplina que a Lei Maior deu à matéria e que será melhor analisada no próximo item, foram promulgadas as Constituições Estaduais e as Leis Orgânicas dos Municípios que cuidaram amplamente da questão ambiental, tendo surgido, ainda, os seguintes textos normativos (selecionados em razão da sua maior importância): Leis nºs 7.679, de 23.11.88 (sobre a proibição da pesca de espécie em período de reprodução); 7.735, de 22.02.89 (criou o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - IBAM); 7.796, de 10.07.89 (criou a Comissão Coordenadora Regional de Pesquisas da Amazônia - CORPAM); 7.797, de 10.07.88 (criou o Fundo Nacional de Meio Ambiente); 7.802, de 11.07.89 (sobre agrotóxicos); 7.805, de 18.07.89 (criou o regime de permissão de lavra garimpeira e extinguiu o regime de matrícula); os Decretos nºs 99.274, de 06.06.90 (regulamentou as Leis nºs 6.902/81 e 6.938/81, que dispõem, respectivamente, sobre a criação de estações ecológicas e áreas de proteção ambiental e sobre a política nacional do meio ambiente); 78, de 05.04.91 (aprovou a estrutura regimental do IBAMA). Visto, assim, como e onde se deu o surgimento das primeiras leis que tinham por objetivos a proteção ambiental, e já tendo sido dada, também, uma pequena noção do desenvolvimento da matéria em nosso país, compete-nos, na sequência, analisar o assunto a partir das normas e princípios constitucionais garantidores do meio ambiente como bem de uso comum do povo. É o que faremos a seguir. 3. Direito Constitucional ao Meio Ambiente Na medida em que a humanidade se vê ameaçada no mais fundamental de seus direitos -- o direito à própria existência--, tem sido o direito ao meio ambiente alçado a matéria de nível constitucional, passando a receber uma valorização que se faz sentir nas Leis Fundamentais de diversos países estrangeiros. Das que temos conhecimento, foi a Constituição portuguesa de 1976 que deu melhor formulação ao tema ambiental, uma vez que no seu artigo 66 (mantido nas revisões posteriores) ficou estabelecido o seguinte: "1. Todos têm direito a um ambiente de vida humana, sadio e ecologicamente equilibrado e o dever de o defender. 2. Incumbe ao Estado por meio de organismo próprios e por apelo a iniciativas populares: a) Prevenir e controlar a poluição e os seus efeitos e as formas prejudiciais de erosão; b) Ordenar o espaço territorial de forma a construir paisagens biologicamente equilibradas; c) Criar e desenvolver reservas e parques naturais e de recreio, bem como classificar e proteger paisagens e sítios, de modo a garantir a conservação da natureza e a preservação de valores culturais de interesses histórico ou artístico; d) promover o aproveitamento racional dos recursos naturais, salvaguardando a sua capacidade de renovação e a estabilidade ecológica. 3. O cidadão ameaçado ou lesado no direito previsto no n.º 1 pode pedir nos termos da lei, a cessação das causas de violação e a respectiva indenização. 4. O Estado deve promover a melhoria progressiva e acelerada da qualidade de vida de todos os portugueses". No que concerne ao constitucionalismo brasileiro, é certo que anteriormente à Constituição de 1988 nada foi legislado, em nível constitucional, em termos de proteção do meio ambiente. Tem razão, portanto, o renomado professor José Afonso da Silva ao afirmar que das mais recentes Constituições brasileiras, desde 1946, "apenas se extraía orientação protecionista do preceito sobre a proteção da saúde e sobre a competência da União para legislar sobre água, florestas, caça e pesca, que possibilitavam a elaboração de leis protetoras como o Código Florestal e os Códigos de Saúde Pública, de Água e de Pesca" (ob. cit., p. 26). Voltando a atenção para o sistema normativo em vigor, é de inegável constatação a circunstância de ter a Constituição Federal de 1988 instituído um novo modelo de ordem constitucional. De fato, enquanto as Constituições anteriores primavam pela estatuição de normas supremas que cuidavam quase que exclusivamente dos direitos individuais, a atual carta Magna em muito inovou na seara dos direitos metaindividuais, ao criar normas jurídicas diretamente relacionadas à tutela dos direitos coletivos e difusos. A tutela do meio ambiente, como exemplo característico desta espécie de direitos metaindividuais, recebeu um tratamento amplo e moderno do legislador constituinte de 1988, o que já serve para demonstrar a consciência ecológica de que o mesmo estava imbuído, sendo encontráveis, ao longo de todo Texto Constitucional, inúmeros dispositivos concernentes ao assunto. Cite-se, inicialmente, o art. 5º, inciso LXXIII, que, dispondo sobre a ação popular, previu a possibilidade do seu ajuizamento para anular ato lesivo ao meio ambiente. Seguem-se os artigos 23, incisos VI e VII, e 24, incisos VI e VIII, que prevêem a competência material comum e a competência legislativa concorrente dos entres federados (União, Estados, Municípios e Distrito Federal) relativamente à edição de atos normativos sobre o meio ambiente. Mais à frente encontramos o artigo 129, inciso III, que estabelece ser uma das funções institucionais do Ministério Público a de promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos. Depois, temos o artigo 170, inciso VI, que relaciona a defesa do meio ambiente como um dos princípios da ordem econômica. Ainda no título que disciplina a Ordem Econômica e Financeira, o parágrafo 3º do artigo 174 prescreve que o Estado favorecerá a organização da atividade garimpeira em cooperativas, levando em conta a proteção do meio ambiente e a promoção econômico-social dos garimpeiros. Já no título relativo à Política Agrícola e Fundiária e da Reforma Agrária, a utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e a preservação do meio ambiente constituem, nos termos do artigo 186, inciso II, requisitos da função social da propriedade rural, sendo que suas inobservâncias podem levar à desapropriação da área para fins de reforma agrária (art. 184). Entra-se, a seguir, no título dedicado à Ordem Social, onde, no artigo 200, inciso VIII, é declarado que ao sistema único de saúde compete, além de outras atribuições, "colaborar na proteção do meio ambiente, nele compreendido o de trabalho". E, por fim, antes do capítulo dedicado ao meio ambiente, encontra-se o artigo 216, inciso V, que inclui os conjuntos urbanos e os sítios de valor ecológico entre os bens integrantes do patrimônio cultural brasileiro. As referências acima apontadas são apenas algumas das que existem no Texto Constitucional. Selecionamos apenas as que entendemos ser mais importantes. Há, também, mais de uma dezena de referências implícitas ao meio ambiente na Constituição em vigor, para cuja verificação remetemos à obra do notável José Afonso da Silva (ob. cit., p. 28), que se preocupou em fazer uma análise completa da matéria. Mas o constituinte federal não se contentou em apenas tratar difusamente do meio ambiente por todo o texto da Lei Maior, pois, adotando posição de vanguarda, dedicou um capítulo inteiro (o Capítulo VI do Título VIII), composto de um único e longo artigo (art. 225), ao tema sob comento. Prescreve o referido artigo 225, em seu "caput", que "todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações." Verifica-se, de imediato, que o caráter de direito difuso (direito que não é usufruído com exclusividade por ninguém) foi bastante ressaltado na mensagem normativa que abre o capítulo do meio ambiente, na medida em que reconhece o meio ambiente ecologicamente equilibrado como bem jurídico autônomo, em relação ao qual se confere à coletividade um direito. O parágrafo 1º do artigo 225, com seus diversos incisos, contém, em sua maioria, normas de conteúdo programático, pois impõem deveres ao Poder Público, tais como: preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais, promover a educação ambiental, proteger a fauna e a flora etc. O que não se pode deixar de mencionar é que esta espécie de norma constitucional, que frequentemente é chamada de norma sem garantia ou sanção, não é destituída de eficácia jurídica, visto que, em lição que já se tornou clássica em nossa doutrina, José Afonso da Silva asseverou que: "Em conclusão, as normas programáticas têm eficácia jurídica imediata, direta e vinculada nos casos seguintes: I - estabelecem um dever para o legislador ordinário; II - condicionam a legislação futura, com a conseqüência de serem inconstitucionais as leis ou atos que as ferirem; III - informam a concepção do Estado e da sociedade e inspiram sua coordenação jurídica, mediante a atribuição de fins sociais, proteção dos valores da justiça social e revelação dos componentes do bem comum; IV - constituem sentido teleológico para a interpretação, integração e aplicação das normas jurídicas; V - condicionam a atividade discricionária da Administração e do Judiciário; VI - criam situações jurídicas subjetivas de vantagem ou de desvantagem" ("Aplicabilidade das Normas Constitucionais", Ed. RT, 1968, p. 150) Já os demais parágrafos do artigo 225 serão analisados no decorrer deste trabalho. O importante, segundo nos parece, é ressaltar, mais uma vez, que o constituinte mostrou largo interesse pelo meio ambiente, editando preceitos que alteram significativamente nosso direito positivo, a ponto de hoje podermos reconhecer a existência de um direito constitucional a um meio ambiente sadio e ecologicamente equilibrado. 4. Degradação do Meio Ambiente Acreditamos que o trabalho que se está a elaborar tem sua importância facilmente verificável, na medida em que passou a ser uma preocupação mundial a proteção dispensada ao meio ambiente, até porque, se tal atitude não estivesse a ocorrer, a humanidade estaria caminhando a passos largos para o seu completo aniquilamento. Fala-se hoje, muito acentuadamente, na seriedade dos problemas que atingem o meio natural em que vivemos, tais como: desflorestamento e extinção das espécies; erosão do solo e surgimento de desertos; poluição do ar e das águas; chuva ácida e destruição da camada de ozônio; efeito estufa; mudanças bruscas no clima da Terra etc. Soluções eficazes para muitos desses problemas estão sendo encontradas, e, ao mesmo tempo, tem sido criados instrumentos legais para a tutela do patrimônio ambiental, caracterizado como "res omnium" (coisa de todos) por Sérgio Ferraz ("Responsabilidade Civil por Dano Ecológico", "in" RDP 49-50/35). A degradação do meio ambiente natural, que, em razão de seus altos índices, já passa a ameaçar a própria sobrevivência humana, recebeu, recentemente, um mapeamento mundial por parte de ambientalistas preocupados com o futuro do planeta Terra (publicado no jornal "Folha de São Paulo", edição de 30 de maio de 1994, p. 6-4). Relacionamos a seguir os principais problemas ecológicos apontados, a saber: Canadá - queima de petróleo, destruição de florestas temperadas, poluição de grandes lagos por uso de agrotóxico e por causa da chuva ácida. EUA - pesca predatória na costa do oceano Pacífico, queima de derivados do Petróleo, poluição dos grandes lagos por uso de agrotóxico, poluição em rios da costa leste que causa mortandade de salmões. México - pesca predatória na costa do Pacífico, poluição da cidade do México (é a mais poluída do planeta), falta de esgoto e de saneamento básico na Cidade do México. Ilhas do Caribe - exploração predatória de corais, aquecimento global aumenta o nível das marés. Colômbia - exploração de petróleo. Peru - pesca predatória na costa do Pacífico, caça às baleias. Chile - destruição da camada de ozônio, pesca predatória na costa do Pacífico, destruição de florestas temperadas, poluição da Cidade de Santiago, caça às baleias. Brasil - destruição da floresta tropical, destruição de manguezais por especulações imobiliária e poluição industrial e doméstica, poluição de áreas urbanas (São Paulo é a segunda cidade mais poluída do mundo), exploração predatória de corais, exploração do garimpo. África do Sul - caça indiscriminada para extração de peles e de marfim de elefantes, mineração de carvão poluidora. África (parte norte) - extração de petróleo que poluiu toda a área do estreito de ormy. África Sub-Saara - importação de lixos tóxicos por países como a Somália. Países Escandinavos - aparecimento de manchas de petróleo que parecem ter vindo do mar Norte, pesca de baleias na Noruega. Europa Ocidental - queima de derivados de petróleo, poluição de áreas portuárias por causa de derramamento de petróleo (Holanda, Inglaterra e sul da França), poluição do mar do Norte por causa de grande exploração de petróleo (Escócia, Irlanda), destruição de florestas temperadas por causa da chuva ácida (Alemanha). Leste Europeu - falta de segurança de reatores nucleares, importação de lixo tóxico de países da Europa Ocidental. Ucrânia - nuvem de poeira sobre a usina de Chernobil, proliferação de reatores nucleares. Rússia - reatores nucleares, existência de submarinos nucleares, despejo de lixo radioativo no mar. Japão - grande número de usinas nucleares, destruição de fontes fósseis de energia (carvão e petróleo), falta de recursos renováveis de energia, problemas ligados à mineração de carvão, pesca da baleia. Austrália - problemas de poluição urbana na cidade de Sidney, falta de recursos renováveis de energia. Antártida - destruição da camada de ozônio (é causado pelos países industrializados e ataca todo o mundo, embora o buraco, com quatro vezes o tamanho do Brasil, se localize sobre o continente). Como se vê, a seriedade do problema está em convocar todas as pessoas que tenham algum senso de responsabilidade para com os destinos da humanidade a buscar instrumentos eficazes que preservem o meio ambiente, pois, se assim não agirmos, estaremos permitindo que as repercussões de todas as degradações acima apontadas se manifestem na contaminação e deterioração do meio natural em que vivemos, que atualmente já é "de tal monta que põem em risco a continuidade da existência da vida na Terra, ou, melhor dizendo, da vida que ainda existe, pois a extinção das espécies já atingiu um ritmo sem precedentes" (Lourenço Agostini de Andrade,"A Tutela ao Meio Ambiente e a Constituição", COAD/ADV, Seleções Jurídicas, Fevereiro/1990, p. 3). 5 - A prevenção de Danos Ambientais Antes de passarmos à análise dos instrumentos processuais de defesa do meio ambiente existentes no direito positivo pátrio, e após já termos estudado, nos tópicos anteriores, diversos outros aspectos intimamente relacionados ao tema central sob enfoque, cumpre-nos dar conta da previsão constitucional do estudo prévio de impacto ambiental, que se encontra no artigo 225, parágrafo 1º, inciso IV, da Constituição de 1988, com a seguinte redação: "Art. 225............................................. § 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: ........................................................... IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade". Impacto ambiental, segundo a Resolução n.º 001/86 - CONAMA, é qualquer alteração das propriedades físicas, químicas e biológicas do meio ambiente, causada por qualquer forma de matéria ou energia resultante das atividades humanas que, direta ou indiretamente, afetam a saúde, a segurança e o bem-estar da população, as atividades sociais e econômicas, a biota, as condições estéticas e sanitárias do meio ambiente e a qualidade dos recursos ambientais. O que existe de importante na análise do estudo de impacto ambiental, que é exigido para que se assegure a efetividade de um meio ambiente ecologicamente equilibrado (§ 1º do art. 225), é que o mesmo deverá ser realizado anteriormente à autorização de obra ou atividade potencialmente causadora de danos ao meio ambiente. Com previsão dessa natureza, o direito pátrio garante a permanência de instrumentos de tutela ambiental preventiva e passa a receber aplausos de ambientalistas de grande autoridade, como, por exemplo, Antônio Herman V. Benjamin, que, em precioso artigo escrito sobre o estudo prévio de impacto ambiental, teve a oportunidade de ressaltar o seguinte: "O direito ambiental é ou deve ser, antes de mais nada, um conjunto de normas de caráter preventivo. Em todas os segmentos dessa disciplina jurídica se ressalta o aspecto de prevenção do dano ambiental. A tutela do meio ambiente, através de longa evolução, ultrapassou a fase repressiva-reparatória, baseada fundamentalmente em normas de responsabilidade penal e civil, até atingir o estágio atual em que a preocupação maior é com o evitar e não com o reparar ou o reprimir."Nenhum outro instituto de direito ambiental melhor exemplifica este direcionamento preventivo que o EIA. Foi exatamente para prever (e, a partir daí, prevenir) o dano, antes de sua manifestação, que se criou o EIA. Daí a necessidade de que o EIA seja elaborado no momento certo: antes do início da execução, ou mesmo de atos preparatórios, do projeto. Não é à-toa que a Constituição Federal preferiu rebatizar o instituto, passando de "avaliação de impactos ambientais" para "estudo prévio de impacto ambiental" "(" Os princípios do estudo de impacto ambiental como limites da discricionariedade administrativa "," in "Revista Forense, n.º 317. p. 25). Caracterizado o EIA, portanto, como instrumento de prevenção de danos ecológicos, resta dizer que o mesmo já vinha previsto na Lei 6.803/80, sendo que atualmente, a matéria vem disciplinada na Lei 6.938/81, que o elenca entre os instrumentos da política nacional do meio ambiente (art. 9º, inc. III), colocando-o como pressuposto para o licenciamento de construção, instalação, ampliação e funcionamento de estabelecimentos e atividades capazes de causar degradação ambiental. Na conferência das Nações Unidas de Meio Ambiente e Desenvolvimento, realizada no Rio de Janeiro em junho de 1992, o EIA também foi motivo de análise. Nesta oportunidade, passou a constar como um dos princípios da Declaração do Rio de Janeiro o de que"O estudo de impacto ambiental, compreendido como instrumento nacional, deve ser levado a efeito nos casos de atividades propostas, que apresentem o risco de ter efeitos nocivos importantes sobre o meio ambiente e que dependam da decisão de autoridade nacional competente"(Princípio n.º 17) A título de observação derradeira, deve ser alertado que existem outros instrumentos de tutela ambiental que prevêem a possibilidade de se pleitear medida liminar para suspender preventivamente os efeitos do ato impugnado para evitar ocorrência de lesão ambiental, tais como a ação popular, a ação civil pública, o mandado de segurança coletivo e a ação direta de inconstitucionalidade, instrumentos estes que serão detidamente estudados em tópicos separados em razão da sistematização dada ao trabalho. CAPÍTULO III - INSTRUMENTOS PROCESSUAIS DE PROTEÇÃO AMBIENTAL 1 - Tutela dos Direitos Individuais, Coletivos e Difusos Para que possamos iniciar a análise dos instrumentos processuais utilizáveis na proteção do meio ambiente, necessário se faz uma breve perquirição das notas básicas e essenciais dos direitos individuais, coletivos e difusos, dado que o material daí extraído será utilizado na seqüência do estudo ora realizado. Ao contrário das Cartas Magnas anteriores, a promulgada em outubro de 1988 em muito inovou no campo dos direitos metaindividuais (direitos que excedem o mero círculo de interesse individual e particular), haja vista que grande foi o desenvolvimento dado à tutela dos direitos coletivos e difusos. É que, passageiros do mesmo barco,"os habitantes deste irrequieto planeta vão progressivamente tomando consciência clara da alternativa essencial com que se defrontam: salvar-se juntos ou juntos naufragar. A história individual terá sempre, naturalmente, o seu lugar nos registros cósmicos; acima dela, porém, e em grande parte a condicioná-la, vai-se inscrevendo, em cores mais berrantes, a história coletiva. Os olhos da humanidade começam a voltar-se antes para o que diz respeito a todos, ou a muitos, do que para o que concerne a poucos, ou a um só"(José Carlos Barbosa Moreira," A Proteção Jurídica dos Interesses Coletivos "," in "" Temas de Direito processual ", Terceira Série, Ed. Saraiva, 1984, p. 173). Se o direito individual é o que diz respeito apenas a interesses de indivíduos determinados, tendo por características básicas a divisibilidade, a disponibilidade e o exercício pessoal dos mesmos (de que é exemplo claro o art. do CPC ao dispor que"Ninguém poderá pleitear, em nome próprio, direito alheio, salvo quando autorizado por lei"), os direitos metaindividuais, como a própria textura verbal da palavra está a dizer, são aqueles que, característicos de sociedades de massas, vão além dos interesses meramente interindividuais, não pertencendo nem ao indivíduo, nem ao Estado de forma individualizada, mas envolvem uma pluralidade de titulares, pertencem a grupos, classes, categorias de indivíduos ou formações intermediárias (Flávia Piovessan,"O direito ao meio ambiente e a Constituição de 1988: diagnóstico e perspectivas","in""Cadernos de Direito Constitucional e Ciência Política", Ed. RT, n.º 04, p. 77). Portanto, tem-se que direitos coletivos são os que se referem a determinada categoria de pessoas, a determinada classe ou grupo, podendo-se" identificar seus titulares, que serão determinadas categorias profissionais ou determinadas classes "(Lúcia Valle Figueiredo," Direitos Difusos e Coletivos ", Ed. RT, 1989, p. 11), tais como a família, os partidos políticos, os sindicatos e as associações. Já os direitos ou interesses difusos, no dizer preciso e completo de Rodolfo de Camargo Mancuso,"são interesses metaindividuais que, não tendo atingido o grau de agregação e organização necessário à sua afetação institucional junto a certas entidades ou órgãos representativos dos interesses já socialmente definidos, restam em estado fluido, dispersos pela sociedade civil como um todo (v. g., o interesse à pureza do ar atmosférico), podendo, por vezes, concernir a certas coletividades de conteúdo numérico indefinido (v.g., os consumidores). Caracterizam-se: pela indeterminação dos sujeitos, pela indivisibilidade do objeto, por sua intensa litigiosidade interna e por sua tendência à transição ou mutação no tempo e no espaço"("Interesses Difusos: Conceito e Legitimação para Agir", Ed. RT, 2ª ed., 1991, p. 109). Enquanto os direitos individuais são tutelados por intermédio do exercício pessoal dos interesses em discussão, a salvaguarda dos direitos coletivos e difusos é pleiteada, em regra, pelo Ministério Público (art. 129, inc. III, da Constituição), havendo também previsão no sentido de conferir legitimidade ativa ao cidadão para o ajuizamento da ação popular (art. , inc. LXXIII, da Constituição) e de associações relativamente à utilização da ação civil pública (art. da Lei 7.347/85), além da possibilidade do exercício de outros instrumentos de tutela ambiental, tais como o mandado de segurança coletivo, o mandado de injunção e a ação direta de inconstitucionalidade. O direito constitucional ao meio ambiente ecologicamente equilibrado (que envolve o ar, o clima, o mar, em suma: os bens que fazem parte do patrimônio ecológico), considerado como bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida (art. 225,"caput", da Constituição Federal), é direito que se enquadra na espécie dos direitos indivisíveis e individualizáveis, sendo, portanto, um direito difuso, um direito de todos (="res omnium"), podendo ser tutelado por intermédio de todos os instrumentos processuais a seguir arrolados e estudados. O que não se pode perder de vista é que o nosso sistema normativo consagra o direito fundamental de recorrer ao Poder Judiciário para a correção de lesões a direitos individuais, coletivos e difusos, conforme previsão do artigo , inciso XXXV, da Constituição Federal, que, em norma limitativa dirigida ao legislador, garante que"A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça e direito". Tal preceito não se refere exclusivamente aos direitos individuais (a Emenda Constitucional n.º 1 de 1969, no seu art. 153, § 4º, é que fazia menção somente a"lesão individual"), servindo também para abrigar a lesão ou ameaça de direitos coletivos e difusos, com o que se verifica uma sensível ampliação do direito constitucional à jurisdição. 2 - Ação Civil Pública Estando garantido o amplo acesso ao Judiciário para a correção de eventuais lesões ocasionadas ao meio ambiente, conforme já se viu no item anterior, cumpre-nos analisar o instrumento processual mais específico e importante à defesa ambiental, que é a ação civil pública. Como instrumento jurídico destinado à tutela do direito difuso ao meio ambiente, a ação civil pública encontra previsão constitucional no artigo 129, inciso III, que estabelece ser uma das funções institucionais do Ministério Público" promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos ". Vale ressaltar que no parágrafo 1º do mesmo artigo foi estatuído que a legitimação do Ministério Público para as ações civis não impede a atribuição, por intermédio de lei ordinária, de legitimidade ativa a terceiros, com o que se abre a possibilidade de futuramente as pessoas físicas ajuizarem a predita espécie de demanda ambiental coletiva. A ação civil pública vem disciplinada, presentemente, na Lei Federal n.º 7.347, de 25 de julho de 1985, que: a) estabelece como foro competente para processar e julgar a causa o do local onde ocorrer o dano (art. 2º); b) elenca como partes legitimadas ativamente à sua propositura o Ministério Público, a União, Estados, Municípios, autarquia, empresa pública, fundação e sociedades ambientalistas que estejam constituídas há mais de uma ano (art. 5º); c) prevê a prolação de sentença de natureza condenatória, visando o pagamento em dinheiro ou o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer (art. 3º); d) estabelece uma tutela preventiva para o alcance dos fins previstos na lei (arts. 4º e 12); e) exclui a eficácia" erga omnes "da coisa julgada quando seja o pedido julgado improcedente por deficiência de prova (art. 16); f) previu a hipótese de dispensa do adiantamento de custas, emolumentos, honorários periciais e quaisquer outras despesas, nem condenação da associação autora, salvo comprovada má-fé, em honorários de advogado, custas e despesas processuais (art. 18). Na tarefa que lhe compete como meio processual garantidor da sadia qualidade do meio ambiente, já foram ajuizadas ações civis públicas nos seguintes casos: para impedir o religamento do reator da usina Angra I, até que sanadas as deficiências do plano de emergência para evacuação da área; para paralisar empreendimentos incompatível com a preservação do conjunto paisagístico, ambiental e ecológico da Baixada de Jacarepaguá; para responsabilizar empresa transportadora marítima pelo derramamento de óleo combustível em Santos; para que empresa de manutenção de vagões sediada em Porto Alegre cessasse sua atividade causadora de poluição sonora etc. (exemplos retirados da obra de Luís Roberto Barroso," O Direito Constitucional e a Efetividade de Suas Normas ", Ed. Renovar, 2º ed., 1993, p. 140). Como se verifica, grande é a utilidade e a eficácia desse instrumento legal, cabendo unicamente um correto uso das opções por ele oferecidas para que se possa diminuir gradativamente os malefícios causados ao meio ambiente. Deve ser ressaltado, por fim, que o Código de Defesa do Consumidor (Lei n.º 8.078, de 11.09.90) alterou sensivelmente a lei básica disciplinadora da ação civil pública, ao estabelecer, exemplificativamente, que: a) fica restabelecido o inciso IV do artigo da Lei 7.347/85, anteriormente vetado pelo Presidente da República, para estender a utilização da ação civil pública a"qualquer outro interesse difuso ou coletivo"(art. 110); b) deve ser aplicada à defesa de quaisquer interesse difusos ou coletivos a disciplina processual instituída pelo Código do Consumidor para a defesa desde em juízo (art. 117); c) julgada improcedente a ação civil pública, salvo por insuficiência de provas, impede o ajuizamento de outras demandas coletivas sob o mesmo fundamento, mas não obsta a propositura ou o prosseguimento de ações individuais (arts. 103, 104 e 117); d) acrescenta a possibilidade de outros legitimados promoverem a execução da sentença condenatória na ação civil pública, antes reservada exclusivamente ao Ministério Público (art. 114); e) ocorrendo desistência infundada ou abandono da ação por associação legitimada, o Ministério Público ou outro legitimado assumirá a titularidade ativa (art. 112). 3 - Ação Popular De todos os instrumentos processuais por nós analisados, é a ação popular a mais antiga em termos de previsão constitucional. Com efeito, semelhantemente aos contornos que possui atualmente, a ação popular foi instituída pela Constituição pátria de 1934, sendo suprimida pela de 1937 e restabelecida pela de 1946, continuando nas Cartas Magnas de 1967 e 1969. Na atual Constituição Federal, encontra-se previsão no sentido de que"qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência"(art. 5º, inc. LXXIII). É de ser acolhida no presente estudo a definição elaborada por José Afonso da Silva, segundo a qual"a ação popular constitucional brasileira é um instituto processual civil, outorgado a qualquer cidadão como garantia político-constitucional, para a defesa do interesse da coletividade, mediante a provocação do controle jurisdicional corretivo da ilegalidade de atos lesivos ao patrimônio público"("Ação Popular Constitucional", Ed. RT, 1968, p.105). Executando-se a cláusula relativa à"ilegalidade", já que a atual Carta Magna somente exige a"lesividade"como requisito necessário à invalidade do ato contra o qual se insurge, a noção extraída da lição do mestre paulista será de grande utilidade na compreensão da matéria. Interessa-nos, agora, somente o estudo da ação popular como instrumento viabilizador da tutela ambiental, ao atuar como garantia do direito difuso ao meio ambiente (que pertence à coletividade como um todo), possibilidade esta que se tornou plena a partir da Constituição de 1988, já que esta ampliou o objeto da ação popular para englobar os atos lesivos praticados contra o meio ambiente. Infelizmente, no entanto, permanecem válidas as críticas relacionadas à restrição quanto à legitimidade ativa da ação popular, de vez que, adotando a percuciente observação da nossa ilustre professora Lúcia Valle Figueiredo, estando a legitimidade ativa afeta apenas ao cidadão, torna reduzida a possibilidade da sua utilização, pois não se pode pensar, em cidades pequenas, no autor popular, como cidadão, a enfrentar a" toda-poderosa Administração pública "(" Curso de Direito Administrativo ", Malheiros Editores, 1994, p. 277). É também da lição sempre arguta de José Afonso da Silva, agora extraída de outra obra ("Direito Ambiental Constitucional", Malheiros Editores, 1994, p. 222), que constatamos ser objeto imediato da demanda popular a anulação do ato lesivo ao meio ambiente e a condenação dos responsáveis pelo ato, incluindo os seus destinatários, ao pagamento de perdas e danos ou, alternativa ou cumulativamente, a repor a situação no"status quo", recuperando-se, em conseqüência, o meio ambiente degradado. Já o objeto mediato é a proteção do meio ambiente, o que envolve a idéia de conservação, recuperação e preservação da sua qualidade. Como características básicas da ação popular, podem ser extraídas da Lei n.º 4.717, de 29 de junho de 1965, e da própria Constituição, as seguintes: a) o autor da ação popular somente pode ser o cidadão no gozo de seus direitos cívicos e políticos; b) o ato impugnado deve ser lesivo ao patrimônio público; c) isenção de custas judiciais e do ônus da sucumbência, salvo comprovada má-fé; d) a competência para processar e julgar a ação popular será determinada em conformidades com a origem do ato impugnado; e) caberá a suspensão liminar do ato lesivo impugnado; f) sujeitos passivos serão as pessoas públicas ou privadas e as entidades referidas no artigo da Lei 4.717/65, as autoridades, funcionários ou administradores que houverem autorizado, aprovado, ratificado ou praticado o ato impugnado, ou que, por omissas, tiverem dado oportunidade à lesão, e contra os beneficiários da mesma; g) havendo desistência da ação, qualquer cidadão ou o Ministério Público poderá dar prosseguimento à mesma; h) a sentença terá eficácia" erga omnes ", exceto no caso de haver sido a ação julgada improcedente por deficiência de prova; e i) o prazo prescricional da ação popular é de 5 (cinco) anos. Da análise empreendida, é possível afirmar que tratamos do mais importante meio processual existente em nosso ordenamento jurídico a ligar o cidadão ao controle da higidez do meio ambiente. Com a nova previsão constitucional, foi estendido o emprego da ação popular à tutela ambiental, importando em dizer que, ante tal inovação, foi aumentada consideravelmente a responsabilidade de todos os cidadãos na fiscalização e repressão de atitudes comprometedoras do meio ambiente ecologicamente equilibrado. 4 - Mandado de Segurança Coletivo O mandado de segurança coletivo é um dos meios mais eficazes para a correção de ilegalidade e inconstitucionalidades praticadas por autoridades públicas em face da coletividade, podendo ser impetrado, segundo o que vem previsto no artigo , inciso LXX, da Constituição, por a) partido político com representação no Congresso Nacional, b) organização sindical, c) entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos um ano, em defesa dos interesses dos seus membros ou associados. É meio constitucional posto à disposição desses órgãos que possuem capacidade processual, sendo requisitado de sua admissibilidade a existência de direito líquido e certo, não amparado por"habeas corpus"ou"habeas data", lesado ou ameaçado de lesão, por ato de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça (Hely Lopes Meirelles,"Mandado de Segurança, Ação Popular, Ação Civil Pública, Mandado de Injunção, Habeas Data", Ed. RT, 13ª ed., 1988, p. 32). Importante aspecto do mandado de segurança coletivo é o da sua impetração para a tutela dos chamados" direitos difusos ", já que os dispositivos constitucionais relativos ao meio ambiente revestem-se da natureza dessa espécie metaindividuais. Segundo ensinamento que extraímos da doutrina elaborada pelos juristas Lúcia Valle Figueiredo (" Curso de Direito Administrativo ", Malheiros Editores, 1994, p. 260), José Afonso da Silva (" Direito Ambiental Constitucional ", Malheiros Editores, 1994, p. 223), Celso Agrícola Barbi ("Mandado de Segurança na Constituição de 1988","in"Revista dos Tribunais, n.º 635, p. 22), Flávia Piovesan ("O direito ao meio ambiente e a Constituição de 1988: diagnósticos e perspectivas","in"cadernos de Direito Constitucional e Ciência Política", Ed. RT, n.º 04, p. 91) e Francisco Antonio de Oliveira ("Mandado de Segurança e Controle Jurisdicional", Ed. RT, 1992, p. 232), o direito ao meio ambiente é perfeitamente tutelável por intermédio do mandado de segurança coletivo. Doutra parte, verifica-se que a sentença proferida no mandado de segurança coletivo só produz efeitos "ultra partes" ante a concessão da segurança pleiteada, isto é, a coisa julgada terá sua eficácia estendida a terceiros "secundum litis", advindo somente para beneficiá-los. Com a denegação do mandado de segurança coletivo, os membros ou associados da entidade impetrante poderão ajuizar ações individuais, desde que atendidos os respectivos pressupostos de cabimento. 5 - Ação Direta de Inconstitucionalidade A ação direta de inconstitucionalidade é instrumento processual dos mais úteis à proteção ambiental, uma vez que poderá ser utilizada, dentre outras hipóteses de cabimento, para obter o reconhecimento da desvalia jurídica de lei ou ato normativo infraconstitucional que esteja a violar normas ou princípios constitucionais de preservação do meio ambiente. Situa-se o estudo da precitada ação no âmbito do controle jurisdicional concentrado de constitucionalidade, que é aquele em que se confere competência a um único órgão judicial para apreciar as questões relativas à Constitucionalidade das leis, sendo que a sua origem é de ser situada na Constituição austríaca de 1920, que tomou por base projeto elaborado pelo jusfilósofp Hans Kelsen (cf. Mauro Cappelletti,"O Controle Judicial de Constitucionalidade das Leis no Direito Comparado", Fabris Editor, 1984, p. 75). Adota-se no Brasil a ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual (art. 102, I, a, da Carta Magna) com fito de obter, única e exclusivamente, a declaração de inconstitucionalidade de lei em tese, não existindo, portanto, conflito de interesses em discussão, mas sim um único objetivo de natureza processual que é a retirada da norma inconstitucional do ordenamento jurídico em razão da eficácia geral e do efeito "erga omnes" conferido à decisão do Supremo Tribunal Federal, motivo pelo qual o Senado Federal sequer é comunicado da declaração de inconstitucionalidade. Do que já foi exposto, claro está que para a propositura da ADIN (Ação Direta de Inconstitucionalidade) basta a discussão a respeito de uma tese jurídica, dado que a mesma independe de uma lesão a direito individual ou coletivo, dando-se o controle em abstrato da norma indigitada. O que se busca, na verdade, nesta via de controle, é a verificação da compatibilidade da norma infraconstitucional aos preceitos superiores da Lei Maior que lhe dá fundamento de validade. A Constituição de 1988 introduziu algumas inovações em relação ao controle concentrado de constitucionalidade, quais sejam: a) passou a denominar de ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo a antiga representação de inconstitucionalidade (art. l02, I, a); b) criou a ação direta de inconstitucionalidade por omissão (art. l03, § 3º); c) ampliou a legitimação ativa para a propositura da ADIN (art. l03, I a IX); d) estabeleceu a possibilidade dos Estados-Membros instituírem representação de inconstitucionalidade de leis ou atos normativos estaduais ou municipais em face da Constituição Estadual (art. l25, § 2º); e) estabeleceu a arguição de descumprimento de preceito fundamental da constituição, que ainda depende de regulamentação (art. l02, § 1º). Por imposição constitucional (art. 97 da Constituição), os tribunais pátrios somente poderão declarar a inconstitucionalidade em abstrato de lei ou ato normativo pelo voto da maioria absoluta de seus integrantes, disposição esta que se estende aos tribunais estaduais quando da análise de lei municipal ou estadual (RTJ 89/944). O Advogado-Geral da União deverá atuar nos casos de apreciação de inconstitucionalidade de lei em tese na qualidade de defensor da norma impugnada, sob pena de invalidade da relação processual instaurada (art. l03, § 3º),sendo que também o Procurador-Geral da República tem participação garantida nesses casos (art. l03, § 1º). Não é de se esquecer da competência originária do STF para processar e julgar o pedido de medida cautelar das ações diretas de inconstitucionalidade (art. l02,I,a, da Constituição), com o que se abre a possibilidade de suspensão imediata da norma tida por inconstitucional até o advento da decisão definitiva de mérito. Esperamos que com essa breve apresentação dos principais aspectos jurídicos de ação direta de inconstitucionalidade possamos ter demonstrado a importância de sua utilização em assuntos relativos ao meio ambiente. No estudo realizado por Édis Milaré ("Tutela Jurisdicional do Meio Ambiente", AASP, Setembro/92, n.º 37, p. l7), consta o seguinte exemplo de utilização da ADIN: ajuizamento da ação direta de inconstitucionalidade n.º 350-0/600 pela Procuradoria Geral da República, em atendimento á representação da Associação Brasileira de Caça e Conservação, visando a declaração de inconstitucionalidade do artigo 204 da Constituição Paulista, que proibiu a caça em todo o Estado. 6- Ação Declaratória de Constitucionallidade O ordenamento jurídico pátrio recebeu, no mês de março de l993, uma inovação no âmbito do controle da constitucionalidade das leis, tendo o assunto despertado a atenção de todos que militam na área do direito constitucional. Trata-se da outorga de mais uma competência originária ao Supremo Tribunal Federal, qual seja, a competência para processar e julgar a ação declaratória de constitucionalidade (ADCON), que veio prevista no bojo da Emenda Constitucional n.º 03 de l7 de março de l993. Portanto, atualmente o sistema concentrado de controle da constitucionalidade das leis no Brasil compõe-se de dois tipos de ações diretas ajuizáveis perante o STF: a ação direta de inconstitucionalidade e a ação declaratória de constitucionalidade. De fato, prevê a Constituição em vigor, já com a redação dada pela Emenda n.º 03, a competência do STF para processar e julgar "a ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual e a ação declaratória de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal"(art. l02,I, a). Em seguida, o parágrafo 2ºdo artigoo l02 da Constituição dispõe a respeito dos efeitos da decisão do STF quando do julgamento da ADCON, estando assim redigido: "As decisões definitivas de mérito, proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, nas ações declaratórias de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal, produzirão eficácia contra todos e efeito vinculante, relativamente aos demais órgãos do Poder Judiciário e ao Poder Executivo". A respeito dos legitimados ativamente à propositura da ADCON, estabelece a Constituição que a mesma será de iniciativa exclusiva das pessoas e entidades que arrola: Presidente da República, Mesa do Senado Federal, Mesa da Câmara do Deputados e Procurador-Geral da República (art. l02, § 4º). A ação declaratória possui característica até mais graves do que a avocatória (instrumento da época do regime ditatorial militar), em face de possível violação dos princípios constitucionais do devido processo legal (art. 5º, LVI), da ampla defesa, do contraditório e do duplo grau de jurisdição (art. 5º, LV), e do princípio da inafastabilidade do controle judicial (art. 5º, XXXV), com o que se estaria a violar o disposto no artigo 60, parágrafo 4º, inciso IV da Constituição (ofensa a diretos fundamentais que não podem ser objeto de alteração pelo Poder Constituinte Derivado). Infelizmente, no entanto, o Supremo Tribunal Federal, ao decidir a primeira ação declaratória de constitucionalidade, que dizia respeito a uma suposta inconstitucionalidade da contribuição social denominada COFINS, convalidou, por ampla, maioria de votos, o instrumento processual ora tratado, utilizando-se de argumentação segundo a qual "o que se pretende, assim, com o novo instituto, é tornar mais rápida a definição do Poder Judiciário, em abstrato, sobre a validade ou não de lei ou ato normativo federal, evitando-se, pois, se prolonguem, no tempo, com prejuízo à Justiça, as dúvidas sobre a constitucionalidade de norma, com autêntico tumulto nos Juízos e Tribunais que houverem de aplicá-la, pelo volume de demandas e divergências, em torno do mesmo tema"(trecho do voto do Ministro Néri da Silveira, "apud" "Ação Declaratória de Constitucionalidade", coordenação de Ives Gandra da Silva Martins e Gilmar Ferreira Mendes, Ed. Saraiva, l994, p 22). Em assim sendo, uma das utilidades que a ação declaratória de constitucionalidade poderá ter será a de servir de instrumento de tutela ambiental, na medida em que for ajuizada para obter o reconhecimento da validade constitucional de lei ou ato normativo federal que esteja, supostamente, a entrar em choque direto com normas ou princípios constitucionais relacionados à proteção do meio ambiente. 7- Ação Direta de Inconstitucional por Omissão No âmbito do controle de constitucionalidade concentrado, que se dá perante o Supremo Tribunal Federal, a Constituição de l988 inovou ao introduzir em nosso ordenamento jurídico da ação direta de inconstitucionalidade por omissão. Com efeito, prevê o parágrafo 2ºdo artigoo l03 da Constituição que "Declarada a inconstitucionalidade por omissão de medida para tornar efetiva norma constitucional, será dada ciência ao Poder competente para a adoção das providências necessárias e, em se tratando de órgão administrativo, para fazê-lo em trinta dias". Assim é que preocupando-se o legislador constituinte com a efetividade das normas constitucionais dependentes de regulamentação ulterior ou de uma providência administrativa para que sejam implementadas, deixou-se clara a possibilidade de os interessados (art. l03), ante a inércia do Legislativo ou do Executivo em não fazerem aquilo a que estão constitucionalmente obrigados, requererem ao Judiciário, em nome de toda a coletividade, o reconhecimento da omissão e a notificação do órgão competente para que este a supra, tornando possível o comprimento de preceito constitucional destituído de plena eficácia. Infelizmente, a Constituição brasileira, neste particular, foi tímida por ter simplesmente copiado o instituto da inconstitucionalidade por omissão da Constituição portuguesa, porque, conforme bem observou José Afonso da Silva, "a mera ciência ao Poder Legislativo pode ser ineficaz, já que ele não está obrigado a legislar. Nos termos estabelecidos, o princípio da discricionariedade do legislador continua intacto, e está bem que assim seja. Mas isso não impediria que a sentença que reconhecesse a omissão inconstitucional já pudesse dispor normativamente sobre a matéria até que a omissão legislativa fosse suprida. Com isso, conciliar-se-iam o princípio da autonomia do legislador e a exigência do efetivo comprimento das normas constitucional" (Curso de Direito Constitucional Positivo ", EDRT, 5º ed., , p. 47). Precisa é a crítica do mestre paulista, razão pela qual adotamo-la" in totum ". Sendo, como se viu, ineficaz o provimento jurisdicional pleiteado na ação de inconstitucionalidade por omissão, somos da idéia de que se deva acatar algumas propostas elaboradas pelo professor Luís Roberto Barroso ("O Direito Constitucional e a Efetividade de Suas Normas", Ed. Renovar, 2ª ed., 1993, p. 171/172) e que dizem respeito ao tratamento das omissões legislativas que fossem, em princípio, insanáveis por via judicial. Vejamos quais são as propostas, que são integralmente adotadas neste estudo: 1 - Nos casos em que a iniciativa da lei dependa do Executivo, sua inércia em encaminhar a mensagem num prazo a ser fixado transferiria a competência a qualquer parlamentar para deflagrar o processo legislativo. 2 - Ampliação da legitimação para a iniciativa do processo de elaboração legislativa, estendendo-a aos Poderes estaduais e aos cidadãos, diretamente, por mecanismos a serem regulamentados. 3 - Fixação de um prazo para a discussão e votação dos projetos que tenham por objeto integrar os comandos constitucionais cujos efeitos estejam paralisados por falta de regulamentação. Ao término deste prazo, o projeto seria incluído na ordem do dia, obrigatoriamente, por determinado número de sessões, ao termo das quais, se não houvesse sido apreciado, nenhum outro projeto poderia ser votado antes que sobre ele se deliberasse. Como a matéria relativa ao meio ambiente também está entre aquelas em que, em alguns casos, é necessária a edição de lei integradora de um comando constitucional ou a prática de atos impostos pela Constituição para que se possa dar plena eficácia jurídica e social às normas de direito por ela (Constituição) previstas, a omissão do legislador ou de órgão administrativo leva ao descumprimento da Constituição e caracteriza sua abstenção como ilegítima, possibilitando, assim, o ajuizamento da competente ação direta de inconstitucionalidade por omissão. Exemplos de normas constitucionais, relativas ao meio ambiente, que exigem a expedição de normação jurídica ordinária executória são as seguintes: artigo 174, parágrafo 3º, artigo 200, inciso VIII, artigo 225, parágrafo 1º (que traz, em sua maioria, previsão de normas de conteúdo programático). Há que se anotar, por fim, que os tribunais superiores têm firmado entendimento segundo o qual o pedido de liminar é incompatível com o objeto mediato da ação por omissão (RT 668/212 e RTJ 133/569) e que é desnecessária, nessa espécie de demanda, a audiência do Advogado-Geral da União (JSTF 133/8, RTJ 131/463, RT 659/205 e RDA 179/138). 8 - Mandado de Injunção Outra inovação constitucional relacionada ao suprimento da inércia legislativa, configurando uma autêntica ação de defesa de direitos assegurados pelo constituinte de 1988, diz respeito ao mandato de injunção, que encontra supedâneo no artigo , inciso LXXI, da Constituição Federal, que tem a seguinte redação:"conceder-se-á mandado de injunção sempre que a falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania". Marcelo Figueiredo, monografista do tema, elaborou uma definição do instrumento processual ora tratado que, pela precisão, merece ser transcrito," in verbis ":" Mandado de injunção é a ação constitucional posta à disposição de qualquer pessoa física ou jurídica, apta à tutela de direito individual, coletivo e difuso, toda vez que houver falta de regulamentação de direito infraconstitucional, que obstaculize sua fruição "(" Mandado de Injunção e a Inconstitucionalidade por Omissão ", Ed.. RT, 1991, p. 36). Da definição precitada já se antevê que o mandado de injunção poderá ser utilizado por qualquer pessoa, e até mesmo pelo Ministério Público, para tornar viável o exercício de um direito constitucionalmente assegurado, inerte em razão da existência de norma regulamentadora desse mesmo direito. É medida apta à tutela ambiental, uma vez que é a própria Constituição que assegurou que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, direito este que é considerado como bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida (art. 225). Ao sustentar o cabimento do mandado de injunção individual na tutela do meio ambiente, estamos a fugir de interpretações restritivas e reducionistas dos direitos e garantias constitucionais, de vez que a interpretação extensiva, fruto da síntese lingüística e do princípio da rigidez formal da Constituição,"é rotineiro e necessário expediente de trabalho de quantos se detenham no exame aprofundado da normativa constitucional"(Celso Ribeiro Bastos e Carlos Ayres de Brito,"Interpretação e Aplicabilidade das Normas Constitucionais", Ed. Saraiva, 1982, p. 24). Ademais, o constituinte, ao inscrever o mandado de injunção no rol dos remédios constitucionais (art. 5º, inc. LXXI), não fez nenhuma restrição quanto à espécie de direito constitucional a ser por ele protegido, com o que abrangidos estão todos os direitos constitucionais. Também alvitramos a possibilidade de impetração do mandado de injunção coletivo por entidades associativas que detenham poderes expressos para representar seus filiados (art. , inc. XXI, da Constituição) e que tenham como uma de suas finalidades sociais a proteção ao meio ambiente. No entanto, cumpre anotar que o supremo Tribunal Federal, segundo nos dá conta o procurador estadual Milton Flaks ("Instrumentos Processuais de Defesa Coletiva","in"Revista de Direito Administrativo, n.º 190 p. 61), por intermédio do Ministro Celso de Mello, em despacho no Mandado de Injunção n.º 390-4 (DJ de 9.6.92), impetrado por um sindicato, ressalvou que a questão do cabimento do mandado de injunção coletivo e da legitimidade ativa para sua impetração não foi ainda definida no âmbito daquela Corte. Em razão disso, e considerando o dissenso que lavra na doutrina, resolveu processá-lo, reservando-se para apreciar o problema quando do julgamento da demanda. O mandado de injunção não se confunde com a ação de inconstitucionalidade por omissão. Esta é uma assertiva feita por todos os estudiosos da matéria. E com razão. Veja-se que a legitimação ativa para o ajuizamento da ação de inconstitucionalidade por omissão é privativa das pessoas e entidades arroladas no artigo 103 da Constituição. Por sua vez, o mandado de injunção tem como legitimados ativamente qualquer um do povo, pessoas físicas ou jurídicas, de direito privado ou público, desde que tenham interesse de agir. Mas a principal diferença entre os dois remédios constitucionais está no conteúdo da decisão a ser proferida. É o que esclarece o mestre processualista Celso Agrícola Barbi, quando averba que"na ação de inconstitucionalidade por omissão, o STF limita-se a reconhecer a existência desta e dá ciência ao Poder Legislativo, para que este a supra. Enquanto isto, no mandado de injunção, o juiz criará a regra concreta necessária a satisfazer o direito de requerente"("Supremo Tribunal Federal, Funções na Constituição Federal de 1988","in"Revista dos Tribunais, n.º 656, p. 18). O STF, infelizmente, por uma opção política de todo criticável, tem interpretado o mandado de injunção de maneira a igualá-lo, no tocante aos seus efeitos, à ação de inconstitucionalidade por omissão, pois tem se limitado a comunicar a mora legislativa ao Poder competente, quando deveria criar, para o caso concreto e com efeito"inter partes", a norma regulamentadora para tornar eficaz o direito garantido na Constituição. Exemplo dessa interpretação equivocada é dado pelo acórdão inserto na Revista Trimestral de Jurisprudência, n.º 131, página 492, cuja ementa está assim redigida:"O mandado de injunção nem autoriza o Judiciário a suprir a omissão legislativa ou regulamentar, editando o ato normativo omissivo, nem, muito menos ainda, lhe permite ordenar, de imediato, ato concreto de satisfação do direito reclamado; mas, no pedido, posto que de atendimento impossível, para que o Tribunal o faça, se contém o pedido de atendimento possível para a declaração de inconstitucionalidade d

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